Neuropsicóloga afirma que há diversas estratégias para resolver as queixas de esquecimento A neuropsicóloga Gislaine Gil, doutora em Ciências Médicas pela Faculdade de Medicina da USP e fundadora do programa Vigilantes da Memória, está acostumada com queixas de esquecimento de seus pacientes mais velhos, mas faz questão de alimentar um otimismo que é baseado na ciência e na plasticidade do cérebro, que fique bem claro. "Em vez de usar a palavra declínio, prefiro dizer que o envelhecimento provoca várias modificações. Não lembrar de uma palavra que parece estar na ponta da língua acontece em qualquer idade!", afirma.A neuropsicóloga Gislaine Gil, fundadora do programa Vigilantes da Memória Divulgação / Paulo Henrique PampolinTambém ensina que, assim como as coisas e situações se modificam durante a vida inteira, o mesmo acontece com as conexões neuronais: "a regra vale para o resto do organismo. Se não nos exercitamos, perdemos massa muscular, os músculos vão ficando mais fracos. Os neurônios precisam ser estimulados para formar novas conexões". O bom é que, com a devida estimulação, o "rejuvenescimento" da memória pode ser surpreendente.Mas como saber se estamos apenas num processo de "modificações", como diz a doutora Gislaine, ou trilhando o duro caminho de uma doença neurodegenerativa? "Há uma linha tênue entre as queixas de memória e um quadro de doença neurodegenerativa, mas podemos estabelecer uma fronteira, que é quando há um impacto funcional na vida da pessoa. Por exemplo, perguntar repetidamente a mesma coisa sem conseguir registrar a informação; não lembrar o nome de pessoas muito próximas; pagar duas vezes a mesma mercadoria; ou não conseguir fazer um caminho com o qual se tem intimidade", responde.Ela acrescenta que há também transtornos cognitivos leves que podem estar associados a doenças crônicas que não estejam sob controle, como hipertensão, diabetes, ou apneia do sono. Ansiedade, depressão e estresse prolongado costumam igualmente provocar queixas relativas à memória, em qualquer idade, porque têm reflexo na atenção. Nesses casos, é a avaliação neuropsicológica que vai diferenciar se as queixas estão relacionadas a transtornos leves ou a algum processo degenerativo. "Se for uma demência, a doença não tem cura, mas o paciente pode se beneficiar com medicação e reabilitação cognitiva, que visa a estimular áreas que ainda estão intactas", ressalta.Já os pequenos lapsos não têm relação com quadros mais graves, mas interferem na autoimagem e alimentam preconceitos sociais sobre a velhice. Para esse grupo, a doutora Gislaine enfatiza que o treino cognitivo faz toda a diferença: "não se trata de fazer palavras cruzadas ou jogar damas, e sim de trabalhar estratégias que ajudam o paciente a resolver a queixa. Usamos uma abordagem ecológica, que leva em conta todo o ambiente que o cerca".Quando aprendemos uma coisa nova, é como se o cérebro abrisse uma gavetinha e guardasse aquela informação. Conforme crescemos e ampliamos nosso repertório, vamos categorizando essas informações, ou seja, colocando em gavetas diferentes. Com o tempo, podemos acabar com um gavetão bagunçado, onde as coisas de misturam. "Às vezes temos que ser estimulados a usar essa categorização para fazer uma associação imediata, de modo que possamos saber onde guardamos uma determinada coisa depois de um ano", explica, dando como exemplos as senhas que utilizamos: "normalmente são sequências de números que não significam nada, mas que podem ser transformadas em palavras e frases das quais não esqueceremos". Portanto, pense nisso na próxima vez em que estiver prestes a cravar um "123abc@#*" e opte por algo como "MeuCachorroSeChamaMax"! O Programa Vigilantes da Memória foi sua tese de mestrado e hoje é implantado em empresas e hospitais. Gislaine é ainda autora dos livros "Ensinar a lembrar" com o geriatra Alexandre Busse, lançado em, 2014, e "Como lidar com problemas de memória e doenças neurodegenerativas", de 2019, além de manter o blog "Lembre e relembre". "Ser ativo é poder exercer plenamente a autonomia, fazendo escolhas e tomando as decisões sobre a própria vida", finaliza.
G1