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Estudo diz que 45,7% das operações policiais em favelas do RJ descumpriram decisão do STF por falta de comunicação ao MP

Por Redação em 24/11/2021 às 00:30:38
Blindado da PM circula na Cidade de Deus

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Segundo a decisão do STF sobre restrições a operações policiais, toda incursão em favela deve ser comunicada. O levantamento, que também revelou o alto grau de letalidade nessas ações, foi desenvolvido pelo grupo GENI/UFF, que considerou o perĂ­odo de junho a novembro de 2020.


Um levantamento feito pelo Grupo de Estudos de Novos Ilegalismos da Universidade Federal Fluminense (GENI/UFF) apontou que 45,7% das operações policiais em favelas do Rio de Janeiro descumpriram a determinação do Supremo Tribunal Federal (STF), que impôs restrições a atividade policial durante a pandemia da Covid-19.

Entre as obrigações legais para a realização de incursões em favelas, estĂĄ a necessidade de comunicação ao Ministério PĂșblico do Rio de janeiro (MPRJ), com até 24 horas de antecedĂȘncia. Além disso, as forças de segurança também precisam apresentar uma justificativa para a atividade, visto que a decisão do STF permite operações policiais em comunidades somente em "hipóteses absolutamente excepcionais".

"Quando o uso da força não é feito de forma regulada, quando vocĂȘ não tem formalização, quando não tem respeito aos protocolos e ao controle externo e interno da atividade policial, quando o controle não é efetivo, isso abre uma fenda muito grande para a brutalidade e para a corrupção policial", comentou Daniel Hirata, professor de sociologia da UFF e pesquisador.

Em nota, a PolĂ­cia Militar afirmou que tem cumprido integralmente a decisão do STF. Segundo a corporação, todas as operações são comunicadas ao Ministério PĂșblico.

Ainda de acordo com o levantamento, que considerou o perĂ­odo de junho a novembro de 2020, o nĂșmero de mortos nessas operações é maior quando não existe acompanhamento do MP.

O estudo indica que a PolĂ­cia Civil não comunicou 91,1% de suas operações em favelas no perĂ­odo analisado. A corporação teve uma média de duas mortes por operação.

JĂĄ a PolĂ­cia Militar, com uma porcentagem de subnotificação de 21,1%, registrou quatro mortes para cada dez operações - ou seja, uma taxa de probabilidade letal de 40%.

A anĂĄlise das comunicações foi elaborada a partir do mapeamento dos dados do MPRJ e da base de operações do próprio GENI/UFF. Durante o perĂ­odo analisado, 268 operações foram comunicadas ao MP, embora haja registros de 494 ocorrĂȘncias de operações policiais, ou seja, uma subnotificação de 45,7%.

"A anĂĄlise dos dados mostra claramente que as forças policiais não enviam as comunicações de grande parte das operações policiais ao MPRJ e, quando enviam, os critérios não são compatĂ­veis com as normativas feitas pelas próprias polĂ­cias. É urgente que os ministros do STF votem a favor do plano de redução de letalidade policial e sua supervisão pela sociedade civil", explicou Daniel Hirata.

NĂșmeros do estudo:

foram registradas 494 operações policiais em favelas do RJ, entre junho e novembro de 2020;

nesse perĂ­odo, apenas 268 incursões foram comunicadas ao Ministério PĂșblico;

45,7% das operações policiais em favelas do RJ descumpriram decisão do STF por falta de comunicação ao MP;

apenas 6,7% das operações foram motivadas por mandado de busca e apreensão, ou seja, com respaldo da Justiça;

nos Ășltimos 15 anos, 13.584 pessoas foram mortas pelas forças policiais;

entre 2007-2021, 11.383 operações policiais foram realizadas só na Região Metropolitana;

neste perĂ­odo, quase 1 em cada 5 mortes ocorridas no Rio de Janeiro foi resultado de ações policiais;

em 2019, o estado registrou 1.643 mortes por intervenção policial, nĂșmero 313% maior que o observado em 2013;

nos primeiros oito meses de 2021, as forças policiais responderam por 37% do total dos homicĂ­dios;

desde que a determinação do STF entrou em vigor, houve uma queda de 34% na letalidade policial;

entre janeiro de 2019 e outubro de 2021, policiais mataram 102 crianças e adolescentes no Rio de Janeiro;

STF decidirĂĄ sobre restrições

Na próxima quinta-feira (25), o Supremo Tribunal Federal (STF) vai julgar se mantém ou derruba a determinação de que operações policiais no Rio, durante a pandemia, só podem acontecer em casos excepcionais e com conhecimento do Ministério PĂșblico.


Policiais armados em helicóptero blindado da PolĂ­cia Militar em operação na Maré — Foto: Francisco de Assis/ TV Globo
Policiais armados em helicóptero blindado da PolĂ­cia Militar em operação na Maré


A proibição imposta por decisão liminar do ministro Edson Fachin, começou a valer em junho de 2020 e estabelece uma série de critérios para a realização de operações policiais, com o objetivo principal de evitar danos às comunidades e a perda de vidas em confrontos.

O texto da lei em vigor, prevĂȘ responsabilização civil e criminal em caso de descumprimento das proibições. A decisão de Fachin permite operações policiais em comunidades somente em "hipóteses absolutamente excepcionais", sem exemplificar quais seriam.

Caso o STF aprove em definitivo a Ação de Descumprimento de Preceito Fundamental (ADPF) nÂș 635, que foi ajuizada pelo Partido Socialista Brasileiro (PSB) e estĂĄ em vigor por decisão liminar do ministro Edson Fachin, o estado do Rio de Janeiro serĂĄ obrigado a elaborar, no prazo mĂĄximo de 90 dias, um plano visando à redução da letalidade policial e ao controle de violações de direitos humanos pelas forças de segurança fluminenses.

O plano deverĂĄ ter medidas objetivas, cronogramas especĂ­ficos e previsão dos recursos necessĂĄrios para a sua implementação.

Pontos importantes da ADPF:

fim do uso dos blindados aéreos em operações policiais;

a proteção a comunidade escolar;

a garantia do direito à participação e ao controle social nas polĂ­ticas de segurança pĂșblica;

e o acesso à justiça e a construção de perĂ­cias e de provas que incluam a participação da sociedade civil e movimentos sociais.

Na opinião do pesquisador Daniel Hirata, para que a lei cumpra seu objetivo serĂĄ fundamental dar transparĂȘncia a todas as metas estipuladas para reduzir a letalidade policial no estado, assim como as informações das operações policiais.

"O julgamento é muito importante porque ele pode conduzir a criação de um plano de redução da letalidade policial (...) Com a supervisão judicial e a participação da sociedade civil, esse plano pode garantir que as metas estabelecidas para a redução da letalidade policial sejam cumpridas", comentou o Hirata.

Hirata lembra que quem deve fazer esse controle é o Ministério PĂșblico, jĂĄ que o órgão é o responsĂĄvel por fiscalizar a atividade policial. Como argumento, o professor citou a operação da PolĂ­cia Civil no Jacarezinho, que terminou com 28 mortos, em maio — a mais letal da história do estado.

"No caso do Jacarezinho, foi feita uma investigação autônoma e perĂ­cia independente. Nós tivemos a denĂșncia de dois policias da Core, coisa que eu não lembro quando que tenha acontecido. Isso é uma sinalização importante de que o controle externo da atividade policial feito pelo MP apresenta resultados", pontuou Hirata.

Retorno da secretaria de segurança pĂșblica

Além de cobrar mais transparĂȘncia e fiscalização das atividades policiais no Rio de Janeiro, o pesquisador da UFF também questionou o fim da Secretaria de Segurança PĂșblica do Estado. Em 2019, no inĂ­cio da gestão do atual governo - ainda sob o comando do ex-governador Wilson Wtzel - o Rio de janeiro passou a ter a Secretaria de PolĂ­cia Militar e a Secretaria de PolĂ­cia Civil no lugar da antiga pasta da segurança.

"O fim da Secretaria de Segurança é uma coisa que a gente tem que reverter com a mĂĄxima urgĂȘncia. Com o fim da secretaria, nós tivemos uma aceleração do processo em curso de autonomização das forças policiais. Isso efetivamente é muito ruim porque é necessĂĄrio que o poder armado seja submetido ao poder eleito. E não o contrĂĄrio. A extinção foi muito ruim para tudo que se imagina que deve ser feito no âmbito do controle da atividade policial", comentou.

No estudo do Geni/UFF, em 2019, ano de extinção da Secretaria de Segurança PĂșblica,1.643 pessoas morreram em intervenção policial. Este nĂșmero é 313% maior que o observado em 2013, quando o Rio teve 398 mortes por intervenção de agente do Estado, o menor indicador entre 2007 e 2020.

O levantamento também mostrou que nos primeiros oito meses de 2021, as forças policiais responderam por 37% do total dos homicĂ­dios. Este foi batizado como "estatização das mortes".

Como forma de comparação, a porcentagem média nacional das mortes cometidas por policiais no total de mortes em 2019 foi de 13%.

Menos operações em ĂĄrea de milĂ­cia

O trabalho de pesquisa também apontou que nos bairros sob o controle das milĂ­cias, a polĂ­cia tem uma atuação mais tĂ­mida, em comparação com regiões dominadas por outros grupos criminosos.

Embora as milĂ­cias jĂĄ tenham controle da maior parte da cidade, a maior quantidade de operações policiais ocorre onde hĂĄ predominância de territórios em disputa e onde o grupo armado predominante é o Comando Vermelho.

"Ao utilizar as operações policiais como indicador de favorecimento polĂ­tico-coercitivo, não estamos validando a crença de que elas são efetivas no combate ao crime, mas sim chamando a atenção para uso das operações policiais como um instrumento de interferĂȘncia nos conflitos territoriais armados e o favorecimento de alguns grupos armados em relação aos seus rivais", dizia parte do material divulgado pelos pesquisadores.

O que diz a PM

Em nota, a PolĂ­cia Militar afirmou que as operações estão alinhadas com a decisão do Supremo Tribunal Federal (STF).

A corporação disse também que tem cumprido integralmente a decisão do STF e que todas as operações são comunicadas ao Ministério PĂșblico - e tĂȘm como base inteligĂȘncia, investigação e ação.

Fonte: G1

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